Mohammed, pode e deverá ser, o
nome mais comum da comunidade muçulmana. Num lugar distante da nossa
civilização cristã, se por ventura chamarmos por este nome, certamente
responderão uma catrefada de pessoas do sexo masculino.
Mohammed, é um menino comum numa
vila quase sem lugar no mapa. Com feições simétricas, cor morena que
caracteriza qualquer marroquino e uma doçura que contagiou este coração mole,
Mohammed não é um nome, nem uma criança comum no nosso meio ocidental.
Conversámos durante uma caminhada
desde a aldeia nova de Taouz até à velha, num calor invernal de cerca de 30ºC. Criou-se
uma grande empatia entre nós e fui tentando comunicar. O menino tinha uma
enorme vontade de se expressar e eu uma vontade enorme de o ouvir. O meu
francês desaparecera há muito tempo e a compreensão tornou-se difícil. Do pouco
que percebera, falava-se da escola e da família que estava na Suíça e em
França. Caminhamos lado a lado e fui fotografando-o como se de meu modelo se
tratasse. Chegando a aldeia velha, apercebi-me através do Mohammed, de como o
mundo pode ser injusto e desigual. Apercebi-me das dificuldades que muitas
pessoas passam para sobreviver e da diferença, de nós Europeus egocêntricos, nos
preocuparmos com futilidades. A consciência de que é preciso voluntários para
mudar o mundo, tocara-me. O menino não tirava os olhos de nós, que nos sentávamos
numa sombra, e a vontade de nos conhecer, acrescentava-lhe. Outras crianças,
viviam ali e brincávamos às “acaçadinhas, subíamos muros, saudávamos as cabras.
Mohammed tentava jogar à bola com um calhau pesado e vendo que era ineficaz
qualquer drible, começou a contar até 10 em inglês. Fiquei maravilhada!
Compreendi que aquele inglês era fruto do incentivo do governo marroquino, para
o ensino daquela que é a língua mais falada em todo o mundo.
No caminho de volta, aprimorei o
inglês do Mohammed e ele ensinou-me a contar até 10 em francês, porque até isso
me esqueci. E naquele caminho de terra batida, íamos a trautear tanto em
inglês como em francês, numa aprendizagem mútua.
Na chegada à aldeia nova, fui
recebida e acarinhada pela a família daquele rapaz que me acompanhou. Convidaram-me
para beber chá na casa deles, ao qual entrei, e com muita pena minha tivera que
recusar, não empatando o grupo, porque deveríamos partir. Naquele momento, uma
faca atravessava-se em mim. “Fica para a próxima”, retorquiu o pai de Mohammed.
E ficará! Porque aquele menino
ficou-me marcado na alma. Porque me respeitou, assim como eu o respeitei.
Porque me fez pensar na minha vida e de como eu sou abençoada, assim como me
fez pensar na vida de milhões de pessoas que lutam por mais um dia na Terra.
Porque há crianças que têm tudo com tão pouco. Porque fiquei com um amigo e sei
que voltarei a vê-lo. Porque vi em Mohammed, a vontade de ser mais do que
aquilo que está limitado a ser.